quinta-feira, 18 de junho de 2009

NÚMEROS DA DESIGUALDADE


Segundo as Nações Unidas a população mundial é composta por 51% de mulheres e 49% de homens.

Entretanto, as mulheres:

  • realizam 70% das horas de trabalho, contando-se o trabalho produtivo, os cuidados familiares e domésticos e as atividades de gestão comunitária;

  • recebem 10% dos salários em circulação;

  • controlam 1% dos meios de produção;

  • representam 4% da cúpula do poder formal;

  • são três em cada quatro pessoas que vivem em situação de pobreza;

  • representam duas em cada três pessoas analfabetas.


No Brasil:

  • Nível de escolaridade: As mulheres trabalhadoras destacam-se como tendo maior escolaridade que os homens do que os homens em situação similar (25% da força de trabalho feminina tem segundo grau completo, enquanto entre os homens apenas 17% tem). Nas categorias de profissionais liberais, 31% dos médicos, 30% dos advogados e 42% dos arquitetos são mulheres.

  • Mercado de Trabalho:

    • Em 1985, 37 em cada 100 mulheres brasileira trabalhavam. Tal número pulou para 48, em 1995.

    • Em 1998, enquanto as mulheres brancas recebiam o equivalente a 79% do salário médio dos homens, as negras recebiam o correspondente a 40% dos rendimentos destes.

    • Cerca de 40% das mulheres que trabalham encontram-se no setor informal, sem nenhum tipo de proteção social ou direito previdenciário.

    • Por colta de 50% das trabalhadoras concentram-se em ocupações nas quais se encontram apenas 5% da força de trabalho masculina. Da mesma forma, cerca de 50% dos homens concentram-se em ocupações em que só 5% da mão-de-obra é feminina. Trata-se da chamada “segregação ocupacional por sexo”.

  • Segundo a OIT – Organização Mundial do Trabalho, as mulheres chegarão à igualdade de condições com os homens, se as conquistas continuarem no ritmo atual, somente daqui a 470 anos.


UM POTENCIAL ESQUECIDO

Historicamente, as mulheres negras sempre exerceram liderança nas comunidades. Depois da Abolição dos Escravos, os negros brasileiros deixaram de ser um elemento essencial na ordem econômica e passaram a ficar na marginalidade. A ideologia do “branqueamento da raça” trouxe para o país os imigrantes, identificados como os trabalhadores ideais.

Diante da marginalidade sofrida pelos homens negros, são as mulheres que vão assumir a sobrevivência das comunidades como quituteiras, domésticas, lavadeiras... O que acaba se constituindo no que chamamos de o “matriarcado da miséria”. Todas as famílias negras brasileiras tem uma ancestral, a chamada mãe negra, que à custa de muito sacrifício pessoal assegurou que seus descendentes tivessem uma outra condição de vida.

O candomblé é uma das poucas religiões cuja liderança é preferencialmente feminina. Na cultura africana, a mulher não é uma pessoa desprovida de poder, como na cultura judaico-cristã. As mulheres são até controladas pelos homens, mas porque se enxerga nelas o poder sobre as forças da natureza, um poder temido.

Quando o feminismo moderno bradou para que as mulheres pudessem trabalhar fora, ocupassem as praças, deixassem de ser condenadas ao mundo privado, para a maioria das mulheres negras isto soou estranho, pois elas já estavam nas ruas há muito tempo, trabalhando e lutando pelo seu sustento e de suas famílias. Entretanto, como essas mulheres possuem baixa escolaridade, são estigmatizadas pela herança da escravidão, ou seja, são socialmente desqualificadas, essa liderança não é reconhecida.

O fato de não ser reconhecida impede que esta liderança possa se desenvolver plenamente e expressar toda a potencialidade das mulheres negras. Se houvesse investimento nessa força, isso permitiria a sociedade ter acesso a uma série de talentos.




MULHERES TRABALHADORAS BRASILEIRAS

O perfil das trabalhadoras brasileiras

A participação das mulheres na força de trabalho é crescente. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1973, elas constituíam 30,9% da População Economicamente Ativa (PEA). Em 1999, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) indicava que esta participação já atingia 41,4%, correspondentes a 32,8% milhões de pessoas. Cerca de 40% da população feminina (81,9 milhões de mulheres) encontrava-se então no mercado de trabalho, na condição de ocupada ou de desempregada.
A maior parcela das mulheres ocupadas (43,9%) trabalhava como assalariada, enquanto outras 17,2% atuavam em serviços domésticos. As funções eram exercidas principalmente na prestação de serviços (29,4%), em atividades agrícolas (20,4%), sociais (17,4%) e no comércio de mercadorias (13,5%). Apenas 8,4% trabalhavam na indústria de transformação.
Nas regiões metropolitanas, a participação das mulheres no mercado de trabalho tende a ser ligeiramente maior do que na média de todo o Brasil, uma vez que o dinamismo econômico dessas localidades oferece mais oportunidades profissionais. De acordo com a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), realizada pelo Dieese, Fundação Seade e instituições locais em seis regiões metropolitanas, aproximadamente 50% das mulheres estão no mercado de trabalho.
Apesar da crescente participação, as mulheres ainda estão no mercado de trabalho.

Quando se comparam os anos de 2000 e 2001, nota-se que a participação feminina cresceu, exceto nas regiões metropolitanas de Porto Alegre e Recife, enquanto a masculina aumentou apenas no Distrito Federal.

O maio fluxo de mulheres para o mercado de trabalho não significa, porém, a garantia de obtenção de emprego. Em todas as regiões metropolitanas onde a PED é realizada, a taxa de desemprego das mulheres é superior à dos homens.

Em 2001, apesar do melhor desempenho da economia no primeiro semestre, o desemprego cresceu ligeiramente em todas as regiões, exceto em Porto Alegre e São Paulo. De maneira geral, as mulheres foram mais afetadas que os homens. Em Belo Horizonte, por exemplo, o desemprego cresceu 0,9 ponto percentual para as mulheres e 0,1 ponto percentual para os homens. Em Recife, o desemprego para os homens diminuiu e para as mulheres, cresceu. Além das dificuldades para conseguir emprego, as mulheres estão sujeitas a trabalhar em postos mais vulneráveis do que os homens. A proporção de mulheres com vínculos de trabalho precários, sem garantia de acesso a nenhum benefício social (sem carteira assinada, autônomos que prestam serviços, empregados domésticos e trabalhadores familiares não-remunerados) é sistematicamente superior à dos homens, em todas as regiões pesquisadas.

Mesmo assim, os dados de 2001, quando comparados aos de 2000, apontam pequena redução do número de pessoas com inserção precária, justificada pelo desempenho positivo da economia no primeiro semestre do ano, com a geração de postos de trabalho com carteira assinada. Observa-se, assim, que a redução da participação das mulheres em ocupações vulneráveis foi maior que a dos homens. Em Porto Alegre, por exemplo, enquanto a proporção de mulheres neste tipo de posto de trabalho diminuiu, a de homens aumentou.

A CRISE E AS DESIGUALDADES DE GÊNERO


A crise e as desigualdades de gênero

Por Nalu Faria*


Nesse artigo analisamos as relações entre a crise e as desigualdades de gênero, tomando por base o conceito de Divisão Sexual do Trabalho, tal como define Daniele Kergoat. Queremos ir além dos impactos e ver como as relações de gênero estão no coração do sistema, sustentando as relações econômicas.

Para enfrentar a crise do modelo capitalista, do ponto de vista das mulheres, são necessárias mudanças em relação à Divisão Sexual do Trabalho, e não apenas rearranjos.

De acordo com Kergoat, homens e mulheres são dois grupos sociais engajados em uma relação social específica – relações de gênero – que tem como base material a divisão sexual do trabalho. Essa divisão social do trabalho tem dois princípios organizadores – o da separação (que separa trabalho de homens e de mulheres) e o da hierarquização, em que o trabalho do homem vale mais que o da mulher. Esses princípios permanecem os mesmos, mas suas modalidades mudam significativamente no tempo e no espaço1.

O debate da economia feminista aponta para uma grande mudança nas relações de gênero quando incorpora a divisão sexual do trabalho como estruturante no modo de produção capitalista. Isso significou a naturalização do trabalho de reprodução da vida e estabeleceu uma redução do conceito de trabalho àquele executado na esfera mercantil. Dessa forma, considera-se uma externalidade ao modelo a grande quantidade de trabalho doméstico e de cuidados realizados pelas mulheres no âmbito da família.

A economia feminista buscou desvendar os mecanismos que invisibilizam o aporte econômico das mulheres e deslocam suas demandas para o terreno do social.

No início da globalização neoliberal eram perceptíveis as mudanças advindas das lutas feministas e, ao mesmo tempo, as diferentes formas como o capitalismo se utilizou dessas mudanças.

É inegável que houve uma ampliação da identidade feminina para além da maternidade. Além disso, são parte das transformações a incorporação das mulheres de forma mais diversificada no mercado de trabalho, a ampliação do divórcio e mudanças nos padrões de sexualidade em vários países, o reconhecimento como direitos de questões antes consideradas do mundo privado, como a questão da violência sexista e a legalização do aborto em muitos países.

Tal como ocorreu nas fábricas no fim do século XIX, no neoliberalismo as mulheres foram incorporadas massivamente aos setores da produção e de serviços mais mal pagos que, nesse momento, estiveram marcados pela terceirização e pela precarização.

Por outro lado, um pequeno contingente de mulheres com alta escolarização foi incorporado em funções superespecializadas e executivas. Assim, essas mulheres passaram a ter, diretamente, interesses opostos aos daquelas que estão nos trabalhos precários, mal remunerados, em tempo parcial.

É importante considerar que a entrada massiva das mulheres no mercado de trabalho se deu ao mesmo tempo em que se reafirmava que elas deveriam seguir um padrão estrito de feminilidade. Essa exigência, assim como várias outras mudanças sob o neoliberalismo, se ancorou na modernização tecnológica e na profunda mercantilização dos processos da vida.

O discurso é que as mulheres podem comprar esse padrão de feminilidade usando toda uma parafernália, que vai de cosméticos a tratamentos estéticos, ginástica, botox, cirurgias plásticas. Tudo isso, recentemente, prometido com mais eficiência com a utilização da nanotecnologia.

Com essa intensificação da mercantilização houve um forte incremento do tráfico de mulheres e da prostituição, como parte da indústria do lazer e entretenimento. Nesse debate, muitas vezes são utilizadas justificativas que relacionam esse fato com a busca por liberdade e autonomia das mulheres. Assim, tiram de cena a máfia que movimenta bilhões à custa da exploração forçada das mulheres.

Na atualidade, tem sido mais exposta a tensão que as mulheres vivem com a presença simultânea nas esferas da produção e reprodução. A migração das mulheres dos países do Sul para o Norte tem um componente de solução para essa tensão, uma vez que boa parte das migrantes vai trabalhar na casa de executivas europeias ou norte-americanas, realizando parte do trabalho doméstico e de cuidados.

A crise na sociedade e na economia capitalista é também uma crise em seu modelo de reprodução baseado na utilização do tempo de trabalho das mulheres como um recurso inesgotável2.

Mas é inegável que profundas transformações ocorreram não só com as mulheres escolarizadas, mas também com as das camadas mais pobres. Essas mudanças estão vinculadas às suas práticas concretas, embora estejam marcadas por uma extrema complexidade. Por exemplo, a desresponsabilização dos homens pela paternidade e o aumento das mulheres que arcam sozinhas com o sustento dos filhos, a gravidez na adolescência, a violência urbana e envolvimento dos filhos com o tráfico.

Fruto do esforço de análise das feministas, cada vez mais mitos são desfeitos, como o de que as relações sociais se baseiam em famílias com um homem provedor e uma mulher reprodutora. Além da visibilização do aspecto econômico do trabalho doméstico, hoje já não é possível ocultar que nenhuma sociedade pode prescindir do trabalho produtivo das mulheres, seja no campo ou na cidade. E que, em cada família onde as mulheres não estão no mercado assalariado, mais bens e serviços são produzidos no âmbito doméstico.

Em momentos de crise, ou quando há desemprego na família, as mulheres são obrigadas a esticar os recursos, o que em geral significa mais sobrecarga de trabalho. Por exemplo, serviços que eram adquiridos no mercado voltam a ser produzidos no âmbito doméstico.

É necessário dizer que há pouco debate e análises sobre que tendências estão colocadas em termos de rupturas e deslocamentos que se darão nas relações de gênero e na vida das mulheres com a crise atual.

Em outro momento poderíamos dizer que haveria redução do emprego das mulheres para garantir o emprego do homem provedor. Mas já não é mais possível fazer automaticamente essa análise em função das mudanças ocorridas nas práticas e nas representações de homens e mulheres, inclusive no mercado de trabalho.

Para citar um exemplo, o jornal O Estado de S. Paulo3 trouxe há algumas semanas um artigo sobre os cursos profissionalizantes para pessoas atendidas pelo Programa Bolsa Família. O texto mostrou que na construção civil prefere-se mulheres como azulejistas porque elas são mais cuidadosas. Isso poderia ser analisado como uma ampliação do mercado de trabalho das mulheres e do reconhecimento de sua qualificação – cuidadosa. Mas, em geral, as mulheres azulejistas ganham menos do que os homens, na mesma função. Esse é um bom exemplo da reacomodação da Divisão Sexual do Trabalho e das práticas sexuadas em que se empurra o gênero para o sexo biológico. E as habilidades e o trabalho das mulheres continuam menos valorizados e sem reconhecimento.

Outro elemento é que a criação de empregos e frentes de trabalho emergenciais, comuns em tempo de crise, normalmente excluem as mulheres.

Além disso, sendo a crise atual uma crise sistêmica, ela expressa a falência desse modelo em distintas esferas. As respostas de mercado significam mais concentração de riqueza, exploração do trabalho de homens e mulheres e reacomodação das desigualdades.

Trata-se de pensar quais transformações e quais respostas são necessárias para que nas crises não se busquem novas formas de continuar utilizando as desigualdades de gênero em co-extensividade com as relações de classe e raça, para manter as mulheres fixadas em um lugar naturalizado que afirma uma suposta essência feminina e nega o direito à autonomia e à liberdade para as mulheres.


* Nalu Faria é coordenadora da REMTE (Rede Latinoamericana Mulheres Transformando a Economia) e da Marcha Mundial das Mulheres no Brasil.


1 Danièle Kergoat. “Divisão sexual do trabalho e relações sociais de sexo” In Trabalho e Cidadania Ativa para as mulheres. Caderno da Coordenadoria Especial da Mulher, São Paulo, 2003.

2 Nalu Faria e Miriam Nobre, A Produção do Viver. Cadernos Sempreviva, São Paulo, 2003.

3 O Estado de S.Paulo, 22-02-2009


quarta-feira, 17 de junho de 2009

Quem somos?





A questão da opressão das mulheres permeia toda sociedade, independente da classe social da qual se trata. Esta opressão, assim como todas as outras, se encontra também no seio da classe trabalhadora, nas periferias urbanas, na vida de milhares de mulheres.

Em muitos lares nas periferias urbanas o único sustento vem do trabalho das mulheres, e mesmo assim este lar se sustenta sob a égide do patriarcado.

Atualmente, metade do salário geral da classe trabalhadora é conquistada pelas mulheres, a desigualdade de gênero tem como uma de suas conseqüências salários mais baixos para a mulheres, isso faz com que a renda da classe como um todo caia significativamente acarretando na piora das condições de vida dessa parcela da sociedade. A divisão sexual do trabalho além de sobrecarregar a vida das mulheres causando jornadas dupla ou triplas de trabalho, também impede as mulheres de participarem efetivamente de espaços políticos.

Além disso, se contarmos as tarefas de cuidados que as mulheres realizam em seu cotidiano como trabalho (mesmo que este não seja remunerado) chegamos à conclusão de que 70% do trabalho realizado no mundo é realizado pelas mulheres. O fato do trabalho doméstico não ser reconhecido como trabalho, como os exercidos fora dos muros do lar, também impede o próprio reconhecimento das mulheres enquanto classe trabalhadora.

A violência doméstica, abuso sexual, submissão e desvalorização das mulheres, nível de escolaridade inferior ao dos homens, dentre milhares de outras manifestações de opressão, até o atual momento da história da luta de classes, apenas dificultam a emancipação dos trabalhadores e trabalhadoras, atrasam o processo de consciência da classe, e garantem a produção e reprodução do capital.

Entendendo que o machismo não nasce junto com o capitalismo mas que a organização das mulheres da classe trabalhadora é uma questão de princípio, pois sem a libertação das mulheres do jugo patriarcal, não há socialismo e que a contribuição das mulheres no processo de emancipação humana é fundamental. Então, surge a necessidade da criação do Núcleo de Gênero Ana Terra dentro das Brigadas Populares. Este Núcleo visa ao trabalho com as mulheres das periferias urbanas, lutando pela libertação das mulheres das mazelas do patriarcado e do capitalismo, visando ao empoderamento das mulheres nos espaços políticos, conquista de direitos sexuais e reprodutivos, igualdade salarial, combate à violência doméstica, o fim da divisão sexual do trabalho, etc.

Atuamos pela certeza de que mulheres trabalhadoras juntas e organizadas constroem juntas o poder popular!